domingo, 10 de junho de 2012


Tenho saudades tuas.

Às vezes gostava de conseguir escrever sempre que sinto a tua falta, sempre que me relembro de ti, sempre que descubro algo novo para amar. Gostava de conseguir escrever-te a toda a hora para nunca me esquecer de nenhum fragmento teu, nenhuma nuance da tua essência que me ajude a manter-te perto, mesmo estando tu tão longe. Mas não consigo – estás demasiado enraizado em mim. Demasiado tudo.

Tu sabes que escrever é a minha catarse, o exorcismo dos meus demónios, o esconjuro das minhas dores. E tu, tu sempre foste a minha virtude, a melhor parte de mim. E eu admito, eu admito que tenho medo de te perder nas entrelinhas dos meus sentimentos atropelados, de te escrever até à exaustão do significado da saudade. Quero que permaneças incólume à erosão dos dias e à melancolia das horas. Quero que continues em mim no teu expoente máximo, sem cair na tentação de divinizar-te ou inventar-te como se faz aos mortos. Não preciso disso, tu sempre foste suficientemente bom; na verdade, sempre foste bem mais do que apenas suficiente. Eras inteiro e acho que isso diz tudo.

E eu lembro-me de quando te encostavas em mim e dizias que não entendias a minha fé quase cega num deus tão mal acabado. E depois sorrias, sorrias com o corpo todo e explicavas-me que não tinhas fé no meu deus desastrado, mas em mim que tinha todos os sonhos do mundo nos olhos. E eu ria como menina que era, porque a tua divinização da minha pequenez humana era quase absurda. Mas acreditava. Acreditava em tudo o que me dizias, pela simples razão de seres o que de mais verdadeiro tinha.

Hoje dou-te razão. Hoje também não entendo como tinha tanta fé num deus que te roubou de mim. Um deus que nos matou aos dois e ainda teve o descaramento de permitir que o meu coração moribundo continuasse a bater e a lutar por uma vida que não valia metade sem a tua. Mas até na morte me deste alento, até morto me deste algo em que acreditar. Hoje não tenho deus, tenho-te a ti e às nossas memórias e vou rezando a um vácuo qualquer para que isso seja suficiente.

Mas tenho saudades tuas. Terei sempre saudades tuas. Porque nem a tua divinização me consola. Porque a tua imortalidade me parece distante da minha realidade e custa-me não sentir o calor do teu abraço, a serenidade da tua gargalhada. Porque tu eras o meu alicerce e não me posso erguer no abstracto. Tenho saudades tuas, no fundo é só isso. E esse já é demasiado. Demasiado como tu.